Por Luiz Carlos Azedo
• A discussão sobre a legalidade das “doações eleitorais” fará parte dogrand finale dessa história policial nos tribunais. Não haveria “petrolão”, porém, se não houvesse um “centro único”
Para os escritores de romances policiais noir não existe crime perfeito. Todos deixam um rastro e têm uma motivação. É aí que o detetive durão entra em cena. Com seus problemas e defeitos, ele consegue chegar lá. Primeiro, segue os rastros deixados pelos bandidos; e começa a desvendar o crime quando descobre a sua motivação. Ao mesmo tempo, enfrenta desafetos e administra seu drama pessoal. Segue as pistas às vezes por puro instinto. Assim se constrói a trama da boa estória policial.
A Operação Lava-Jato é uma grande história policial, que deixa no chinelo muitos romances noir de sucesso, porque é uma trama que envolve doleiros, lobistas, executivos de uma grande petroleira estatal, os donos das maiores empreiteiras do país e políticos, muitos políticos – num país latino-americano que faz parte do rol das potências emergentes. Nada disso, porém, é ficção. Seus principais protagonistas já estão em cana, mas falta achar o chefão.
Não existe um detetive cana-dura, mas uma equipe de delegados, agentes e peritos da Polícia Federal, reconhecidamente eficiente, e um grupo de procuradores abnegados, que seguem o dinheiro saqueado da Petrobras por um esquema de “acumulação primitiva” de grandes empresas de engenharia, que atuavam como se ainda estivéssemos no tempo das companhias das Índias. O nosso herói noir é o juiz Sérgio Moro, titular da Vara Federal de Curitiba.
Como nos folhetins dos tabloides policiais norte-americanos da década de 1950, desde o ano passado a Operação Lava Jato é o assunto mais quente dos telejornais. Cada dia que passa, a história revela detalhes da atuação de seus protagonistas, mas nunca se chega ao poderoso chefão. Ele permanece oculto, atua nas sombras para embaralhar o processo, obstruir as investigações, proteger aqueles que podem revelar sua verdadeira participação na trama.
O escândalo da Petrobras era um crime quase perfeito, não fossem o rastro e a motivação. O rastro é o dinheiro, cujo percurso está sendo monitorado pelos órgãos de controle do sistema financeiro. Foi graças à movimentação do dinheiro que o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque foi preso. Ele tentou transferir o dinheiro para Mônaco e foi pego. Também foi por causa da movimentação do dinheiro que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), caiu em desgraça. Negou a existência de contas na Suíça e elas apareceram.
Contas na Suíça eram o refúgio mais seguro para o dinheiro sujo. Não são mais faz tempo. Para quem não se recorda, o escândalo do propinoduto no Rio de Janeiro, durante o governo Anthony Garotinho, eclodiu porque as autoridades daquele país informaram ao Ministério Público brasileiro a existência de contas suspeitas de fiscais da Receita fluminense. Um banco havia comprado o outro e, na auditoria, separou o dinheiro podre, que foi abatido dos ativos. O fato foi informado ao Ministério Público da Suíça.
A lavagem de dinheiro
Podemos tecer considerações sobre o cluster formado em torno da Petrobras para desviar dinheiro da empresa, cujo caso mais espantoso, sem dúvida, é a criação da Sete Brasil, a empresa contratada para fornecer as sondas do pré-sal. Também podemos teorizar sobre o modelo da “nova matriz econômica”, no qual houve uma fusão de interesses entre velhas oligarquias e a nova plutocracia brasileira para saquear o nosso “capitalismo de Estado”, que entrou em colapso.
Mas o que nos interessa aqui é o caso policial. Os atores da trama que estão presos foram flagrados porque obtiveram algum proveito pessoal nas transações. Esse é o rastro. Mas a grande motivação para a montagem do esquema foi política: a perpetuação no poder do núcleo hegemônico do sistema de alianças que comanda o país.
Com base na experiência do “mensalão”, o dinheiro desviado da Petrobras e de outras empresas e órgãos do governo para o chamado “núcleo político” da “organização criminosa”, para usar a nomenclatura do Ministério Público, foi “esquentado” por meio de doações eleitorais. O que pôs tudo a perder foram os pedágios pagos pelo caminho aos seus operadores (voltamos ao rastro) e os “pixulecos” em benefício dos agentes politicos, o que acabou por “deslegitimar” sua motivação principal: o financiamento de campanha eleitoral.
A discussão sobre a legalidade das “doações eleitorais” fará parte do grand finale dessa história policial nos tribunais. Não haveria “petrolão”, porém, se não houvesse um “centro único” no comando de suas operações, que passava pelos governos Lula e Dilma. Do ponto de vista institucional, a identificação desse centro e o seu desmantelamento é que dirá se a Operação Lava Jato foi bem-sucedida na sua plenitude ou não.
Fonte: http://blogdoazedo.blogspot.com.br
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