segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
Resposta torta - Miriam Leitão
Coluna no GLOBO- Por Miriam Leitão
O Blog do Planalto rebaixou o Brasil. Para justificar o injustificável 53º lugar no PISA, diz o seguinte: “Na lista dos 52 países que estão à nossa frente, apenas um tem o PIB inferior ao do Brasil, a Tailândia.” Como somos a oitava economia, fica o mistério: como podem existir 51 países maiores do que o Brasil? Com argumentos toscos e obviedades, o governo repete sua autolouvação.
Estão na nossa frente, na lista do desempenho da educação, países como Chile, Bulgária, Eslovênia, Estônia, Romênia, Lituânia, Turquia, Sérvia e Trinidad e Tobago. Inúmeros outros de PIBs menores do que o do Brasil.
A educação sempre foi uma chaga aberta no país. Foi protelada governo após governo. Não é um problema só do atual. Na administração passada, deu um passo importante que foi a universalização. Os avanços que ocorreram agora foram insuficientes. É melhor reconhecer isso para dar sentido de urgência a um déficit que pode nos roubar o futuro. Melhor reconhecer os erros do que tentar torcer a aritmética mais básica e dizer que existem 51 países maiores do que o oitavo do mundo.
O Blog do Planalto mobilizou ministros para responder ao jornal O GLOBO, que fez no fim de semana um caderno com o balanço dos oito anos do governo Lula. É natural que um espaço oficial ressalte os avanços e dê menos ênfase aos erros. O que cansa é a versão de que nada de certo ocorreu antes de 2003.
Há um trecho em que a defesa do governo diz que fez uma “minirreforma tributária.” E na lista dos itens dessa minirreforma inclui “prorrogação da DRU e da CPMF.” Em outro trecho, diz que a DRU foi uma forma “engenhosa” feita pelo governo anterior de “desviar R$ 100 bilhões da educação.” Ou bem prorrogar a DRU é parte de uma minirreforma ou é uma forma perversa de desviar recursos da educação. O governo tem que escolher como definir o mecanismo que, a propósito, bom nunca foi. Quando inventada, a Desvinculação das Receitas da União (DRU) tinha o objetivo de ser uma ferramenta temporária, enquanto não se fazia uma reforma tributária. O governo FHC e o governo Lula não fizeram a reforma e o que era para ser temporário se eternizou.
O Blog do Planalto diz que eu fui parcial porque disse que o crescimento de 2010 é em parte devido à queda de 2009. E que ao citar o déficit em transações correntes de US$ 50 bilhões não o atribuí à crise internacional.
Vamos por partes na suposta parcialidade. Que o crescimento de 2010 é em parte devido à queda do ano passado é um fato estatístico. Como se mede o crescimento do PIB comparando um ano com o anterior, a recuperação após uma queda é atingida por um fenômeno conhecido como carregamento estatístico. Isso não desmerece o desempenho de 2010, mas assim é a estatística. Faça-se a conta pelo crescimento médio dos dois anos e se terá que o país cresceu em média 3,5%. Bom, mas nada espetacular.
Quanto ao déficit em transações correntes, ele tem pouca relação com a crise externa. O que os escribas oficiais poderiam ter dito é que mostra a força do crescimento, da importação, inclusive de máquina e equipamentos. O Brasil não teve queda de exportação. Os produtos que o Brasil exporta aumentaram de preço. Então, não se culpe a crise externa pelo déficit brasileiro.
O governo diz que é mito que ele manteve a política econômica do governo anterior e fica procurando nuances para negar o inegável. Diz que a queda das metas de inflação foram mais drásticas antes e agora são mais graduais. Ora, a ferramenta é exatamente a mesma.
É falso dizer que o atual governo derrubou a inflação de dois dígitos para o nível de 5%. Todos sabem que o que fez subir a inflação no finalzinho do governo anterior foi o temor de que o governo Lula fosse colocar em prática certas ideias amalucadas que seus economistas defendiam para segurar os preços.
A média de investimento público dos dois governos é de medíocres 0,8% do PIB. Com o balanço do PAC pode-se fazer mágicas, mas os fatos são eloquentes. A única obra de logística do PAC concluída foram as eclusas de Tucuruí, iniciadas há 30 anos. Mesmo assim, a contabilidade do PAC registra 70% das ações de logística concluídas. O presidente Lula inaugurou, dias atrás, 16 km da ferrovia Oeste-Leste que terá 1.700 km. Não se inaugura uma obra com menos de 1% concluída, a menos que se pense que as pessoas são bobas.
O governo se credita ter diminuído a mortalidade infantil. É verdade. O governo anterior também. A taxa tem caído fortemente há três décadas. A mortalidade infantil caiu, segundo o IBGE, 33% no governo Fernando Henrique, e 27% no atual. A torcida é para que essa queda seja ainda maior no governo Dilma.
A autolouvação chega a comemorar queda de doenças transmissíveis no país, onde quase 5.000 pessoas morrem por ano de tuberculose.
Há dramas urgentes e números inaceitáveis. Se o governo admitisse isso seria levado mais a sério ao mostrar suas conquistas.
Fonte: O Globo 22/12/10
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário