terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Senador Gim Argello Relator do Orçamento distribui verba e faz lobby para esquema fraudulento


Leandro Colon / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

Pelo menos R$ 3 milhões dos cofres do governo federal caíram desde abril na conta de um jardineiro e um mecânico. Eles são laranjas num esquema organizado por institutos fantasmas que superfaturam eventos culturais, fraudam prestações de contas e repassam dinheiro para empresas de fachada. Parte desse esquema é sustentada por emendas e lobby explícito, por escrito aos ministérios, de quem hoje elabora o projeto do Orçamento da União de 2011: o senador Gim Argello (PTB-DF).


Investigação feita pelo Estado mostra que, desses R$ 3 milhões, ao menos R$ 1,4 milhão foi repassado para institutos fantasmas por meio de emendas individuais de Gim Argello no Orçamento. E, logo depois, o dinheiro foi repassado para a conta de uma empresa que tem um jardineiro e um mecânico como donos - tudo sem licitação.

A reportagem rastreou um roteiro fraudulento complexo, que envolve entidades de fachada e laranjas. Inicialmente, o parlamentar apresenta uma emenda ao Orçamento que reserva recursos públicos para promover shows ou eventos culturais. Ele apresenta, além da emenda, uma carta ao ministro da pasta.

O dinheiro é destinado a um instituto fantasma. O suposto instituto, em seguida, repassa recursos para uma empresa de promoção de eventos ou marketing, com endereço falso e em nome de laranja. As emendas constam em rubricas dos Ministérios do Turismo e da Cultura, que não fazem a checagem presencial da prestação de contas do serviço, nem verificam a atuação do instituto e da empresa subcontratada.

Exposição. Por conta desse esquema, Gim Argello fatura - ao menos politicamente - com shows e eventos turísticos no Distrito Federal pagos com dinheiro público.

Nos documentos obtidos pela reportagem fica claro que as prestações de contas entregues ao governo são assinadas pelos laranjas e os endereços dos institutos são falsos.

A reportagem localizou o jardineiro Moisés da Silva Morais em sua casa, numa rua de terra batida na periferia de Águas Lindas, cidade do entorno do Distrito Federal. O nome dele está nos convênios do governo em contratos e orçamentos. O jardineiro Moisés admitiu que emprestou o nome ao esquema em troca de uma promessa, não cumprida segundo ele, de R$ 500 mensais. "Virei laranja", disse.

Estatutos comprados. Os papéis revelam que essas entidades compram estatutos de associações comunitárias de periferia e viram "institutos" somente para intermediar sem licitação os convênios com o governo, em troca de uma comissão, conforme relatos de dirigentes em conversas gravadas.

Líder do PTB, Gim Argello era suplente e virou senador em 2007 após a renúncia de Joaquim Roriz, envolvido em corrupção. Em pouco tempo, ganhou espaço e respeito do governo federal, principalmente da ex-ministra e presidente eleita, Dilma Rousseff.

Em troca da lealdade ao governo, Gim conseguiu um presente político: ser o relator do Orçamento da União, de R$ 1,3 trilhão para 2011. Cabe a ele elaborar toda a proposta orçamentária - incluindo as emendas parlamentares - a ser votada pelo Congresso até o fim deste mês.

O destino das emendas feitas pelo próprio senador para 2010 mostra que, no mínimo, Gim Argello não tem controle sobre o rumo e o uso do dinheiro público que lhe diz respeito.

Ele mesmo, na sua versão , disse que, apesar de destinar emendas, não conhece as entidades, nem acompanha as prestações de contas.

Cartas e lobby. No dia 29 de junho deste ano, o senador enviou uma carta ao ministro da Cultura, Juca Ferreira, e fez um apelo: pediu que R$ 600 mil das emendas feitas por ele fossem transferidos para o Instituto Renova Brasil. O convênio foi aprovado e liberado em R$ 532 mil. Só que a entidade não existe. É fantasma. No endereço funciona uma vidraçaria, a Requinte Vidros.


Fonte: Estadão 05/12/10

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