segunda-feira, 29 de março de 2010

Trilogia de um sincalismo cada vez mais abominável


Por Fernando Alves de Oliveira

Primeira cena:

Sem grande alarde, acha-se em tramitação na Câmara o Projeto de Lei 6708/09, originário do Senado e de autoria do petista Paulo Paim (RS) que torna compulsória a contribuição assistencial.

A mesma que nos dias atuais é paga somente pelos trabalhadores sindicalizados. Isto é, aqueles que, além de recolher a contribuição sindical obrigatória são sócios espontâneos do sindicato, pagando a mensalidade imposta pela entidade. E isto não vale só para trabalhadores, não. É extensivo às empresas, no segmento patronal.

Vale acentuar que a tal contribuição está literalmente vedada pelo Enunciado Normativo 119 do Tribunal Superior do Trabalho TST, que considera inconstitucional sua cobrança pelos não sindicalizados. Para deixar bem claro: só é obrigado a pagá-la quem for associado do sindicato. A sua cobrança, no papel que tudo aceita, foi intentada com o objetivo de servir de custeio às despesas inerentes e decorrentes das convenções coletivas de trabalho e dissídios salariais, além de respaldar outras eventuais atividades assistenciais do sindicato. Na prática, contudo, sua arrecadação destina-se para reforçar o caixa das entidades. Na quase totalidade, autêntico saco sem fundo!

Ao leigo ainda fica dúvida, representada pela óbvia indagação: mas a Constituição não reza que ninguém é obrigado a ser sócio de sindicato? Como se observa, ser “sócio” é ato de vontade pessoal e que não invalida a obrigatoriedade de pagamento da contribuição sindical obrigatória, decorrente de exercício de atividade profissional ou empresarial e estatuída na Consolidação das Leis do Trabalho, por meio do Decreto-Lei 5452, consoante os artigos 578 e seguintes.

Aliás, devemos essa ambigüidade, essa verdadeira estúpida dualidade aos Constituintes que promulgaram a Carta Augusta de outubro de 1988. Certamente premidos pela falta de vergonha que –desde idos tempos- rege os meios políticos deste país, e do indestrutível lobbie que reina no sindicalismo brasileiro, conseguiram a proeza de manter a unicidade sindical, porém permitindo a criação de novos sindicatos, preservando a contribuição sindical obrigatória e desatrelando o Estado do meio sindical (ainda que também somente no papel, persistindo até nos dias atuais nesse faz-de-conta) e –não bastasse- criando uma outra contribuição, a confederativa, felizmente natimorta, já que dependendo de Lei Ordinária complementar, jamais teve sopro de vida.

Conclusão: dos quatro mil sindicatos existentes à época, beiramos hoje a quase vinte mil, o Estado continua responsável pelo registro de entidades sindicais, por meio do Ministério do Trabalho e Emprego e se beneficiando no rateio do bolo sindical com 20% de toda contribuição sindical paga neste país por trabalhadores e empresas.

A contribuição sindical (mãe de todos os vícios e mazelas do sistema) persiste inexpugnável e agora o representante do PT (sempre o partido que se arvora em ser o protetor do trabalhador...) volta à carga tentando, sob a pena do Direito, dar cunho compulsório a uma contribuição que é exigível somente daqueles que são sindicalizados e sob a eterna lengalenga de que o seu produto é “fundamental para a manutenção dos sindicatos”.

Convém igualmente não olvidar que as centrais sindicais (entes inexistentes na legislação igualmente citada) foram reconhecidas e legalizadas pelo atual inquilino do Planalto através de Lei 11.648, de 31-03-2008, o que possibilitaria que ditas centrais passassem a receber doravante a metade do que cabe ao Estado da arrecadação do bolo sindical.

Só que feita ao arrepio da Constituição, tal quizila é agora objeto de decisão pelo Supremo Tribunal Federal, que tem em sua pauta o julgamento da ADIM (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4067. Conclusão: as centrais estão naturalmente iradas, pois julgavam que já neste exercício iriam colocar a mão na massa, que, aliás, é o produto que a elas verdadeiramente interessa (mais de R$ 120 milhões). Aturdidas, praguejam a ação intentada pelo DEM (partido dos Democratas) e com sofreguidão aguardam pela decisão do Supremo. Já disse em comentário anterior e repito: esse choro e ranger de dentes vai ser cada vez mais estrepitoso e longo.

Isto tudo num ano eleitoral é ótimo para que trabalhador e empresário (de vez que ambos são alvos e vítimas dessas contribuições obrigatórias) saibam verdadeiramente quem é quem neste País, especialmente no setor sindical, que virou escada ascendente à vida política. Portanto, a hora e vez da profilaxia estão aí, próximas.

Aliás, já passou da hora e da vez do eleitor identificar, claramente, quem está sempre ao seu encalço a fim de meter a mão no seu bolso. Ou contribuinte de sindicato (profissional e patronal) não vota nas eleições majoritárias e proporcionais? Se ele nunca levou o aspecto sindical em conta, é bom começar a fazê-lo a partir de outubro próximo.

Como tal, não há justificativa que, coerentemente, dê respaldo legítimo à propositura do senador em questão. Ela não passa de mais um ato lesivo ao bolso do contribuinte, de vez que na quase totalidade dos sindicatos brasileiros este é um dos poucos (senão o único real serviço) que se presta ao contribuinte, ou seja, a efetivação de convenções coletivas (tratativas e consecução) que, quando não pactuadas entre as partes (categorias econômicas e profissionais) terminam em dissídios salariais, arbitrados pelos juízes do Tribunal.

Essa, pois, é mais uma cantilena do PT, que, com certeza, será rejeitada –especialmente no plenário do Senado, que ainda não foi em sua maioria cooptado- por estéril, vazia e comprovadamente lesiva aos contribuintes dos sindicatos. Diante disso, é exagero dizer-se que isto aqui (e entenda-se como isto aqui os rincões cada vez mais dizimados em termos do interesse verdadeiramente público e comum aos brasileiros e não dos seus governantes) virou ou não uma república sindicalista? E que, sem exagero, corre o risco de transformar-se em coisa ainda pior!

Leia a segunda e terceira cena

Fonte: Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net 27/03/10
Imagem: pintura de Tarsila do Amaral- Os operários

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